Como descrever o que sabemos hoje sobre o câncer numa única folha? Apesar e infelizmente de estar cada vez mais inserido na vida das pessoas, ainda é um tabu e objeto de pouco entendimento, o que gera muitas vezes uma compreensão errada da doença e de suas peculiaridades. A seguir vou tentar explicar as etapas mais representativas e características da formação e subsistência dos tumores.
ANGIOGÊNESE (formação de novos vasos sanguíneos)
O Câncer é uma doença das células do nosso corpo com defeitos. Posteriormente novas mutações vão se acumulando nas células filhas, causando deformações nos tecidos e órgãos. Uma das alterações clássicas, de quase todos os tumores, é a produção exagerada, porém errática, de novas artérias para irrigar o tumor com sangue cheio de nutrientes. Isto se chama de angiogênese (formação de novos vasos) A angiogênese é indispensável para o tumor sobreviver, visto que o seu crescimento é rápido e desenfreado, precisando de uma reposição cada vez mais veloz de elementos para formar células e alimentar o câncer. É em função disso que o tumor começa a roubar os nutrientes do órgão que o formou e, numa fase mais avançada, do resto do organismo. É aí que o paciente inicia a corrida contra o emagrecimento e a perda de apetite.
INVASÃO TUMORAL E CRESCIMENTO EXPANSIVO
Outra característica dos tumores é a produção de substâncias estimuladoras do crescimento e da reprodução celular, numa velocidade que supera, em muito o ritmo das células normais, por isso que os tecidos tumorais crescem além dos limites dos órgãos que os geraram. Isto se chama de invasão tumoral. Este tipo de invasão de território é uma característica que tecidos e órgãos normais não possuem. Por isso que não temos órgãos como os pulmões entrando no fígado ou coração e vice versa (apenas para exemplificar). O crescimento rápido, e que desrespeita os limites do órgão, causa dores muitas vezes de difícil controle. As dores são dependentes do órgão comprimido. Muitas destas dores costumam piorar a noite ou em climas mais frios. Uma explicação plausível para isso é a diminuição do fornecimento de substâncias para o controle da dor, pelo sangue. Estas dores obrigam o uso de medicamentos fortes como a Morfina. Hoje dispomos de muitos novos remédios para o controle da dor, muito melhores e várias vezes mais potentes que a Morfina, como Metadona, Hidromorfona e Fentanil, entre outros.
METÁSTASES
A terceira diferença das células tumorais com relação às normais é que estas possuem a capacidade de se desmembrar do tumor e viajar para outras partes do corpo, criando espécies de “colônias” de agregados celulares, como filiais do tumor a distância. Isto se chama de metastatizar (as populares metástases). As células tumorais possuem uma capacidade de sobrevivência ímpar, conseguindo se separar do tumor primário, viajar através de células e tecidos, entrar na corrente sanguínea e depois fazer uma parada em outra parte do corpo humano, criando a tal da “filial” do tumor. Nesta etapa a doença está tipicamente avançada e há menos chances de cura. O processo de metástases pode gerar “filiais” diferentes do tumor primário e produzir lesões mais ou menos agressivas. Para isto não há uma regra, então não sabemos qual tumor em qual paciente terá metástases mais ou menos agressivas.
IMORTALIDADE DA CÉLULA TUMORAL
A quarta característica, inimitável, das células tumorais é o conceito de “imortalidade” celular. Considera-se por isso que as células tumorais tem uma vida interminável por conta da perda da capacidade de morrer. Isto em função da inibição do processo chamado de “suicídio celular”. O suicídio celular é a forma de controle que a célula normal tem quando elas sofrem algum tipo de falha, evitando a permanência de células defeituosas no corpo. Este processo de ativação do suicídio se chama de apoptose. A célula tumoral perde a capacidade de ativar o suicídio celular programado (apoptose), pois não reconhece o defeito da célula como sendo perigoso, tornando-se imortal.
RESUMINDO
Enfim, um tumor se caracteriza por ter células defeituosas que crescem rapidamente, produzindo um excesso de vasos sanguíneos para manterem uma nutrição sanguínea exuberante e abundante, devido ao alto metabolismo celular, tem a capacidade de se “desmembrar” da tumoração primária e migrar para outras partes do corpo, formando as desagradáveis metástases e finalmente possuem uma odiosa característica de imortalidade.
É importante aprofundarmos nossa compreensão dos tumores para criar tratamentos para cada etapa. Ou seja, entendendo cada processo em que o tumor se cria, se sustenta e finalmente se sobrepõe ao resto do corpo de um paciente, a ciência pode criar remédios específicos para cada etapa. Isso explica claramente porque não é possível criar um único remédio capaz de “curar” o câncer. Os tumores apresentam múltiplos mecanismos modificados, os quais permitem a adaptação das células aos ambientes mais diversos e hostis. Daí dizer que a cura contra o câncer já existe, mas que os laboratórios não a distribuem porque é mais rentável produzir tratamentos mais caros e que apenas prolonguem a vida, é evidentemente falta completa de conhecimento, além de usar um raciocínio conspirativo e de completa ausência de conhecimento do assunto.
Senhores, o processo de formação de um câncer leva de 10 a 30 anos para iniciar até ser clinicamente evidente e precisa de no mínimo 30 fatores de risco aos quais as pessoas se expõem para que ele possa ser desencadeado. Isto nos diz que precisamos tomar cada vez mais cuidado com as causas conhecidas e nos afastarmos destas.
Hoje já temos remédios para diminuir a produção de vasos sanguíneos pelo tumor, assim como medicamentos que atacam características específicas às células tumorais, que não são achadas em células normais. Há novos medicamentos sendo estudados para induzir a célula a recuperar a capacidade de reativar a famosa apoptose e outros para inibir a excessiva produção de fatores de crescimento celular. Temos algumas centenas de medicações novas, com mecanismos incrivelmente modernos e pouco conhecidos.
Um dia a ONCOLOGIA e a GENÉTICA irão se unir nesta luta e a partir daí serão indissolúveis, mas o caminho é LONGO!