O termo técnico seria: Oncologia Pediátrica. Conceitualmente é a especialidade que trata de pacientes com câncer até os 12 anos. Na cidade de Cachoeira do Sul não dispomos deste tipo de serviço. E por quê?
Tecnicamente estes médicos tem uma formação pediátrica, com todos os conhecimentos voltados para o atendimento dos pequenos com câncer. Doses menores, remédios diferentes, assim como também no que se refere aos tumores. O mundo da oncologia pediátrica é em outra dimensão. Trata-se de um universo paralelo ao nosso, onde os sentimentos e sensações são superlativas e as alegrias e tristezas se entremeiam como em um novelo multicolor de emoções. É difícil não sentir orgulho destes pacientes, mesmo que eles não sejam nossos filhos. É impossível não se emocionar com a coragem que naturalmente nos expressam durante todo o processo da doença.
Minha experiência particular com estes pacientes é pequena, mas tão intensa, que soluço só de lembrar nos momentos vivenciados com eles durante a minha residência médica. De forma curiosa e até cômica, lembro-me de um plantão que fiz no Pronto Atendimento do HCB, ainda em 2011. Na época fui “convocado” pela gentil secretária da administração do hospital. Eu confirmei e lá estava eu atendendo os doentes da vez. No meio do meu descanso, fui chamado para atender um paciente pediátrico e eu comentei com a enfermeira que devia estar havendo algum engano, pois eu não atendia pediatria. No final, desci e atendi uma meiga otite méedia aguda por banho de piscina no meio do verão (queixa comum nessa época). Ao finalizar o plantão retornei com a secretária e comentei que não poderia mais fazer plantões, pois meu amor pelas crianças estava condicionado à saúde delas. Não posso ver gurizinhos e nem guriazinhas doentes, que sofro com isso.
Conto este episódio, pois a minha maior, e mais dolorosa experiência na oncologia pediátrica na residência de oncologia, aconteceu com um menino de 11 anos, que tinha um raro tumor cerebral incurável. Nos dias derradeiros da vida dele, ele tinha sido internado na UTI e durante a visita dos pais eu acompanhava a mãe que chorava inconsolavelmente na beira do leito. O menino, adorado por todos, em determinado momento disse à mãe: “Não chora mãe. Não está doendo. Logo, logo vou ficar melhor” Alguns dias depois ele nos deixava com a saudade do ensinamento de que uma vida curta pode ser tão rica como as mais longevas. Este episódio da minha vida é rememorado cada vez que atendo uma criança.
Crianças com câncer têm melhores chances de se curarem se descobrirem precocemente seus tumores. Os tumores nesta faixa etária são mais agressivos e com um impacto social e familiar maior, mas surpreendentemente respondem muito melhor aos tratamentos hoje disponíveis. Uma das explicações plausíveis é que estes tumores são tão agressivos que a quimioterapia e outros tratamentos disponíveis são mais eficazes em decorrência disso. As taxas de cura podem ser maiores que 80% para a maioria dos tumores pediátricos. Afortunadamente a incidência de tumores pediátricos é bem menor da dos adultos.
Crianças e oncologistas pediátricos merecem meu amor e respeito, respectivamente, pois os primeiros nos mostram como sermos corajosos e os últimos como termos nervos de aço para tratar estes pacientes mirins que travam epopeicas e duras batalhas contra o câncer.
Para atendermos crianças com câncer em Cachoeira do Sul precisaríamos de uma estrutura sensivelmente modificada, com assistência não só para quem padece da doença, mas também todo o apoio para pais e familiares, que sofrem com o ricocheteio de tanta dor, medo e angústia.
Crianças são o maior tesouro da vida e irônica e infelizmente o destino não presenteia todos com esta alegria... Obrigado por existirem caros infantes!